terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Al Capone

Quando Benjamin Franklin escreveu numa carta que in this world nothing can be said to be certain, except death and taxes não pensava decerto em Portugal, onde apenas de há poucos anos para cá isto tem sido mais ou menos verdade. A expressão sulista de Tudo o Vento Levou sempre nos representou um pouco melhor: Death, taxes and childbirth! There's never any convenient time for any of them.

Ainda assim - pelo sim, pelo não - o legislador não quis deixar nada ao acaso no nosso Código do IRS. O primeiro artigo esclarece logo as intenções do Estado:

Artigo 1.º
Base do imposto
1 - O imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) incide sobre o valor anual dos rendimentos, mesmo quando provenientes de actos ilícitos, depois de efectuadas as correspondentes deduções e abatimentos.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Save Ringo


Star like Ringo 
War like a green berret 
You're crazy bring your whole set 
Jay-Z in the range 
Crazy and deranged 
They can't figure him out 
They're like "hey is he insane?" 

Jay-Z em Crazy in Love de Beyoncé

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

:)

Com que então chegou às lojas o melhor quase álbum de sempre? Smile, o golpe de rins com que os Beach Boys se preparavam para arrumar os Beatles e que tragicamente ficou a meio, vê finalmente a luz do dia. Provavelmente ninguém que goste dos rapazes pode ficar contente com esta notícia, que torna tudo um pouco mais triste, e que tira o nevoeiro místico que ficava tão bem a um álbum que já todos terão ouvido em bootlegs de vários formatos (eu não, esqueci-me sempre dessa possibilidade, enfim). Que esteja tudo bem com Brian Wilson é, no fundo, o que se deseja. Já eu, da mesma forma que tenho pena de não ter visto o mundial de 82 devidamente ou de não poder imaginar o que teria sido dirigir-me ao cinema para ver a estreia do Padrinho 2 depois de o esperar durante dois longos anos, dava muito para ter assistido ao ping-pong que começou em Rubber Soul, depois Pet Sounds, Sgt Pepper's e que acabaria em estrondo com Smile. Tentou-se muito, mas nunca uns estiveram tão à altura de outros nesta coisa da música.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Save Ringo


Go back to killing Indians




Numa conferência de imprensa de promoção a Cop Land, um filme de 1997 com Harvey Keitel e Robert De Niro, perguntaram a Sylvester Stallone se não gostaria de repetir a experiência e continuar em filmes de maior, digamos, estatuto. O que se seguiu foi um episódio um pouco previsível (até por eu o estar a contar) mas que distingue as boas pessoas. Depois de confessar o medo que tinha de fazer perder tempo a toda a gente no set por estar fora do seu ambiente, disse que nunca se tinha sentido tão bem enquanto actor e que gostaria de continuar por aquele caminho, mas que, consciente das suas próprias limitações, não via necessidade de defraudar dois públicos: o dos seus filmes e o dos filmes do Robert De Niro (enfim, nem só de Max Cady ou jovem Vito vive De Niro; também há uns quantos filmes de Fockers a mais nesta carreira).

Hoje, entre o argumento de Rocky e o projecto Expendables deixou de fazer sentido questionar o talento de Stallone, embora ainda seja sempre com surpresa que se lhe reconhece inteligência, sensibilidade, humor, e por aí fora. Não aconteceu nada de muito diferente com Clint Eastwood, a quem, após uma dúzia de bons filmes, não se poupa elogios nos mesmos termos à sua anterior carreira de actor, que é só um pouco mais do que duvidosa.

Respeitinho pelas pessoas é a mensagem que pretendo deixar nesta quadra. Um último exemplo vem de Dick Cavett a propósito de uma conversa que teve a contragosto com John Wayne de quem não tinha grande opinião. John Wayne estava em filmagens e interrompia por vezes a conversa para filmar outro take. Num desses regressos vinha a assobiar uma música de Noël Coward e Cavett resolveu apontar a conversa que se seguiu:

«Wayne: Wasn’t he great?
Me: Who?
Wayne: Coward.
Me [startled, realizing now that the tune was Noël Coward’s “Someday I'll Find You”]: Yes.
Wayne: I’ve always loved his stuff. Remember the scene in “Private Lives” when they realize they still love each other?
Me: Yes, and did you know there’s a recording of Coward and Gertrude Lawrence doing that scene?
Wayne: Gee, I gotta get that. I guess I’ve read most of his plays.
Me [still not convinced there isn't a ventriloquist in the room]: I’ll send you the record.
Wayne: Well, thank ya. I like the line [he switched to quite passable upper-class British], “You’re looking very lovely you know, in this damned moonlight.”
Me: I did a show with Coward and, as he introduced them, “My dearest friends, Alfred Lunt and Lynn Fontanne.”
Wayne: I sure would love to have seen them in “Design for Living.” [Mentally I reach again for the smelling salts.] And, damn, I’d love to see that show of yours.
Me: I’ll see that you do. [Jesus! Did I? Oh, I hope so.]
Wayne: That’d be awful nice of ya.
Me: Did you ever think of doing one of his plays?
Wayne: Yeah, but it never got past the thought stage. I guess they figured that maybe spurs and “Blithe Spirit” wouldn’t go together. Can’t you see the critics? “Wayne should go back to killing Indians, not Noël Coward.”
(...)
It required the common sense of Woody Allen to put the whole thing into perspective. When I burbled the story to him, he seemed disappointingly un-astonished.
It reminds you that he’s an actor,” he said. “Not a cowboy.” »

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Meia-noite em Paris

Há uma peça em cena em Lisboa, chamada Design for Living, que foi escrita e interpretada nos anos 30 por Noël Coward. O texto tem um ambiente extremamente familiar que não vem só da sua qualidade intemporal (nunca deixará de haver triângulos amorosos nem uma elite intelectual auto-excluída do povo) mas por antecipar em 40 anos e de forma extraordinária o molde que Woody Allen nunca mais deixou de usar.

Nem o mais experimentado crítico conseguiria saber qual dos autores escreveu a cena que junta uma decoradora de interiores, o seu marido muito mais velho, culto comerciante de arte, uma senhora que compra obras indiscriminadamente e um casal cuja mulher quer muito pertencer àquela gente ao contrário do marido que, fazendo-lhe a vontade, não demonstra qualquer pachorra para a pedantice instalada no apartamento caro de Nova Iorque onde se encontram depois da ópera.

Nunca perceberei o que levou a este cansaço generalizado que as pessoas parecem ter pela insistência de Woody Allen em fazer o mesmo filme todos os anos. Se não fosse por outra razão que não a gratidão (sou sensível a este argumento), a população não se devia deixar levar pelos insuportáveis lamentos de que no tempo de Hannah e Suas Irmãs e Manhattan é que era, o que na verdade não faz mais do que as transformar nas mesmas personagens que Allen coloca na fila do cinema em Annie Hall. No que me diz respeito, só em anos muito extraordinários é que um seu filme não entrou nos meus dez melhores em Dezembro.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Gomes de Sá

Mais coisa menos coisa só há uma mentira a evitar num curriculum vitae: o domínio de linguas estrangeiras. É uma mentira que não sobrevive ao primeiro teste, embora este seja também o último, para o bem ou para o mal. Também na cozinha é aconselhada prudência no momento de vender o talento, mas neste caso o teste pode durar anos até convencer a população. Não é que se defenda uma modéstia nojenta, pelo contrário, mas é fundamental evitar frases como a da experiências na cozinha ou o talvez mais grave eu não sigo receitas. No fundo, evitar o ridículo com mais violência ainda do que quando se escreve um post ou um livro (reparem na liberdade da minha amplitude).

Não defendendo a modéstia, pode defender-se a humildade que deriva da conhecida premissa muito simples de que, de entre quem sabe o que está a fazer, só há três classes de pessoas numa cozinha. A primeira é a das que cozinham segundo uma receita, e nesta estamos praticamente todos nós, não vamos ter ilusões. Pode fazer-se uma vida digna dentro desta categoria e estar muito acima de uma grande franja da população sem nenhuma vergonha. Os segundos, raros, são os que conseguem alterar uma receita para alguma coisa diferente. Com algum talento talvez tão boa como a original, com bastante, melhor. A última é a das que criam um novo prato e estas são pessoas que estão bem identificadas e têm uma carreira. Quem não estiver disposto a aceitar isto vai ter uma vida se não mais difícil, por certo mais arriscada.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Save Ringo


Devia haver leis .2

Concedo numa excepção. É possível que nunca tenha sido editado um disco desnecessário de Sonic Youth em 30 anos, mas aqui a história é de uma família, e do que nos foi dado a ver, muito funcional. Até que em Outubro a Pitchfork anuncia ao mundo a notícia mais triste dos últimos 30 anos de rock: Kim Gordon e Thurston Moore separados. Diferenças artísticas seriam uma maravilhosa razão para o divórcio (aquele último disco a solo de Thurston Moore...), qualquer outra, mais plausível, pode ser deixada para eles.

Devia haver leis

O fim dos REM e a falta de pachorra para os Radiohead trazem de volta um debate fundamental que tenho habitualmente comigo próprio. Nenhuma banda devia durar mais do que dez anos e nenhuma resistiu para lá disso até hoje. As circunstâncias extraordinárias que levam três, quatro, ou cinco pessoas a encontrarem-se, terem talento e estarem de acordo num determinado assunto já são, por si só, um acaso que faz duvidar o mais empedernido dos ateus, mas só por profunda gratidão é que ainda ouço um novo disco de Radiohead, Strokes ou dEUS (este caso ainda é mais grave: uma pessoa que, como o Tom Barman, conhece tão bem Portugal, devia saber que não há nada pior nesta vida que o risco de ser comparado a um António Manuel Ribeiro). Basta-me pôr os olhos nos Blur, Pixies, Beatles, Clash, Pavement, e White Stripes, independentemente da forma mais ou menos voluntária como cada um foi à sua vida, para saber que não há ressentimento póstumo que me arranque estas pessoas do coração.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Mas juro que é o meu único problema com Scorsese

George Harrison - Living in the Material World é o nome do documentário encomendado pela viúva do sempre bem amado beatle a Scorsese após ter visto No Direction Home, o filme sobre a vida de Bob Dylan. Terminei ambos com a sensação de que quem tenha visitado as entradas da Wikipedia para cada um dos músicos, saiu dos filmes com uma excelente opinião da enciclopédia online, mas menos boa do tempo que ocupou no cinema.

Como é evidente estamos aqui perante alguns problemas, o primeiro dos quais é meu: não sei o que constitui um bom filme documentário (sendo que o quase-prefixo 'filme' nesta frase serve para excluir os documentários de 40 minutos dos canais televisão, os quais na verdade também não sei avaliar). Há casos óbvios de investigação jornalística ou de ampliação de micro-fenómenos, ou até de um valor ensaístico (mais vezes panfletário). Ajuda que exista uma história que estava por contar como em Man on Wire ou que um entrevistador especialmente talentoso esteja ao leme da situação, como nos filmes de Errol Morris. Não ajuda escolher uma história tão universalmente conhecida como a de alguém que chegou a ser more popular than jesus.

Ao tentá-lo, Scorsese conseguiu uma proeza fora do comum. Aborrecer de morte aqueles de nós que já leram e viram tudo sobre Beatles e ser extremamente confuso para quem chegou agora (eventualmente estas pessoas existem, tenho comprovado). Por outro lado, e ainda que não haja uma grande quantidade de esqueletos nos armários de George, convenhamos que um filme produzido por Olivia Harrison - a sua última mulher - não deixa ao realizador uma grande margem de manobra para tratar os temas mais delicados da sua vida. A algo célebre tendência para a infidelidade do músico é abordada apenas pela própria viúva, numa frase para se ler nas entrelinhas, mas o momento em que a primeira mulher o troca por Eric Clapton é exaustivamente revisto de todos os ângulos possíveis. Ao tentar atribuir especial protagonismo à carreira a solo pós-Beatles, fica uma sensação triste, e claramente oposta ao pretendido, dos enormes limites de Harrison para a composição - apesar de sucessivas tentativas - muito mais notórios após a separação. O seu grande génio para arranjos tão perfeitos quanto inventivos ou inesperados nas canções do grupo (em quase todas) surge sempre apenas através dos depoimentos de McCartney.

Talvez este filme, como o de Dylan ou dos Rolling Stones, tivesse que ser feito por alguém e, nesse sentido, ainda bem que é Scorsese que se chega à frente, mas, sobretudo neste caso, estamos perante mero trabalho de edição de imagens dos últimos 50 anos, com entrevistas, poucas, a pessoas que já ouviram aquelas perguntas centenas de vezes, aliás como o público. Não há Scorsese no documentário, como não há em No Direction Home, com a diferença de que a biografia de Dylan é uma história melhor.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Save Ringo


Fnac

Tempo

Curioso como o canal AMC (que começou por se chamar American Movie Classics) tem o mote Story Matters Here, produzindo as séries mais lentas dos últimos 40 anos. Mad Men, Rubicon, O Prisioneiro e agora Walking Dead (nunca vi um único episódio de Breaking Bad ou The Killing) têm em comum um ritmo angustiante para um público com uma formação nos últimos dez anos em Lost, 24, Dexter e outros portentos da montagem e edição (nada contra). No AMC parece haver uma estratégia que passa por um paradigma original (para televisão) e um argumento de personagens, não de "história". Sobretudo não há surpresas, não por ser chato mas porque com alguma inteligente manipulação, sabemos sempre o que se vai passar. Curiosamente este modus operandi só correu bem, e de que maneira, com Mad Men e muito mal com os outros três. E, ainda pior, na quarta temporada de Mad Men, o canal cedeu e encheu os episódios de piruetas inconstantes. Não queria armar-me em hipster, mas dá-me ideia de que fui o único a ficar desiludido com isto.

Sei do que falo

A grande vantagem da culinária comum sobre a pastelaria e doçaria é que, com vista grossa, se consegue resultados suficientemente bons para impressionar algumas pessoas durante algum tempo. No trabalho de laboratório exigido por um doce (ou por um cocktail, agora que penso nisso), todas as temperaturas e medidas devem ser cumpridas com rigor microscópico, mas com uma feijoada ou um arroz de peixe há alguma amplitude para o desleixo. Esta cozinha "a olho" herdada de uma multidão de mães que a sabia fazer, gerou uma multidão de filhos que dizem de boca cheia preferir não seguir receitas ou o quanto sempre gostaram de fazer experiências na cozinha. É muito importante fugir da mesa de jantar deste tipo de gente.

Save Ringo

Lennon "was the soul of The Beatles, Harrison was the spirit," Martin said. "Paul was the heart and Ringo was the drummer".

Save Ringo

Lennon was later asked in an interview, "Do you think Ringo is the best rock drummer in the world?" to which he replied, "He's not even the best drummer in the Beatles."

Não há sossego

Da primeira vez este blog durou dois meses. Agora voltei por medo de que o Google Reader acabe. Os 28 seguidores eram a minha rede de segurança do eventual regresso e não achei boa ideia correr riscos. A ver vamos. Boa noite a todos.