terça-feira, 15 de outubro de 2013

De novo Paul Newman e o Método


Desta vez com Rocky Graziano para Somebody Up There Likes Me.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

I'm not drunk. I'm lame.


Esta imagem está há alguns anos na parede da sala de dois amigos e resume quase todo o imaginário que eu tinha de The Hustler antes de o ver. Muito por isto, e por Paul Newman, quando me decidi a fazê-lo, pensei que ia ver um filme no nível de conforto de The Sting, com intrujas, vigaristas, hustlers, que são antes de tudo cavalheiros. Manners before morals podia ser a tagline de uma certa linha de protagonistas não tão anti-heróis assim. Dez minutos pelo filme adentro e, mesmo surpreendido com a luz dura da fotografia, a insistir num noir já fora de moda (o filme é de 1961), achei ainda que sabia perfeitamente o que estava a ver, isto é, o grande precursor das narrativas do talento humilhado de Karate Kid, Rocky III, etc. Se fizesse como Breton e Vaché e mudasse de sala logo que compreendesse o guião ou me aborecesse, provavelmente não teria deixado terminar a primeira partida entre Paul Newman e Jackie Gleason (apesar de não haver nada de errado em nenhum momento até aqui). 

É no bar de um terminal de autocarros durante a noite, que o caso muda de figura e a vulgaridade do filme termina abruptamente. Um encontro de madrugada no único bar ainda aberto da cidade, diz tudo o que precisamos de saber sobre o homem e a mulher que o protagonizam. Já não é necessário revelar que bebem (até já estão a beber café nesse momento), a solidão nunca estará escrita em diálogos e a conversa na mesa é mantida próxima do zero, até que Paul Newman finalmente adormece. Do outro lado da mesa está Piper Laurie, que nunca deixará de aparecer em literal segundo plano, por vezes de forma quase invisível e que, seja pelo que faz seja por ter (muito) melhor texto, nunca mais deixará o filme pertencer a Paul Newman ou a qualquer outro.

Laurie, e o momento tardio em que aparece lembram a mulher perturbada de Detour, mesmo fisicamente. Laurie lembra as personagens quebradas de histórias de Flannery O'Connor. Esse momento no filme transporta-o definitivamente para o ambiente noir que estava prometido e a luz fica mais dura, as sombras mais abundantes e mais negras, e os diálogos tornam-se mais cadenciados, mais angustiados e cruéis. A tragédia espreita, adeus Karate Kid, e esta convicção devemo-la inteiramente a Piper Laurie.

Porque a personagem é mais forte, embora mais estragada e irreparável, sente-se uma inversão dos papéis clássicos de um noir. Parece ser Eddie, o personagem de Paul Newman quem tem para onde continuar após o azar, enquanto que o destino de Sarah está inapelavelmente para lá do ponto de não retorno. Num momento feliz, durante um picnic, Eddie responde, depois de um comprometido silêncio ao primeiro "I love you" de Sarah, com "you need the words?" Sarah diz "Yes, I need them very much. If you ever say them I'll never let you take them back." As respostas de Sarah são sempre relativamente inesperadas, mas é Piper Laurie que lhe dá muito mais do que o texto. É a personagem mais complexa, mas também a mais inteligível quando termina o filme.

Piper Laurie voltaria quinze anos mais tarde a um papel em que ultrapassou em muito o texto, mas desta vez num dueto espectacular com Sissy Spacek, ambas a encerrar para sempre as interpretações de mãe e filha em Carrie. O remake com Julianne Moore irá provar que esta relação de amor, posse, dor que faz parte do melhor do imaginário popular do cinema está muito menos no texto do guião, do que nestas duas actrizes e na sorte do seu encontro.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Exacto, exacto!

Numa entrevista recente, Stan Lee disse estar muito satisfeito com todas as adaptações das suas criações ao cinema. Por criações de Stan Lee entende-se quase tudo o que existe em filme de super-heróis dos últimos anos com excepção de Batman e Super-Homem, ou seja, o Homem-Aranha, Hulk, Homem de Ferro, Quarteto Fantástico, a maior parte dos Vingadores, os X-Men, enfim, o filão principal da mina de ouro. No entanto acrescentava que não consegue compreender um pormenor importante: por que raio são todos os heróis tão atraentes? De facto todos são.

Convenhamos que quando falamos de cinema não costuma haver pessoas repulsivas no ecrã, e nem os não actores do neo-realismo italiano eram desagradáveis. O pai em Ladrões de Bicicletas não envergonhava uma fotografia de grupo do star system do seu tempo, nem as pessoas de carne e osso do experimentalismo de Cassavetes em Shadows eram raparigas e rapazes feios.

Ainda assim, Stan Lee tem razão. Tudo parece agora um pouco mais grave como num episódio de Morangos com Açúcar. Já não é uma questão de morte aos feios, mas de morte à mediania, ao simpático, ao jeitoso. Que seria hoje do sorriso manchado de tabaco da Anna Karina?

Confesso que não penso assim tanto no assunto, sou relativamente conformado, ou melhor, indiferente à situação e, se as há, não consigo pensar nas consequências desta tendência ou se são irreversíveis.

Só que pontualmente o problema torna-se ridículo quando, para um remake de Carrie, se convida a miúda da foto abaixo para representar a rejeitada de um liceu americano. Enfim, ninguém aqui quer ofender a Sissy Spacek, mas que raio procuraram os produtores no casting (nem vale a pena ir mais longe e perguntar para que precisamos de um remake de Carrie)? Uma boa ideia teria sido começar por ler o que achou da interpretação original Pauline Kael em 1976: "Sissy Spacek uses her freckled pallor and whitish eyelashes to suggest a squashed, froggy girl who could go in any direction; at times, she seems unborn - a fetus." Ao invés, isto.


sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Willie Mosconi* ajuda Paul Newman com o Método


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Um post em forma de lista

Haverá bons filmes de desporto para além dos de boxe? Há uns quantos filmes que se tornaram relativamente populares sobre beisebol (sobretudo com ligas amadoras), futebol americano (show me the money), golfe (Kevin Costner) e, claro, o filme que cruzou futebol, Stallone e A Grande Evasão (só agora me ocorreu que o nome Grande Evasão é parecido com Grande Ilusão - este poder de associação...). Está nas salas também um filme de Fórmula 1 e, de facto, os anos 80 do automobilismo parecem ter matéria para inventar um género, embora também existam coisas como Dias de Tempestade. Penso que é impossível fazer um bom filme sobre ciclismo (há - outra vez - um com o Kevin Costner, de bigode), sobretudo nos dias que correm. O Tour deve ser extremamente cinematográfico, mas tremo de pensar num filme sobre "o drama do dopping" (e ainda mais sobre Lance Armstrong, que, aposto, já estará em produção em algum sítio). Como não é possível fazê-lo sem o mencionar (ao dopping), e como não estou a ver que seja possível mencioná-lo sem mau gosto, então esperemos que não aconteça nunca. O basquete oscila entre o Lobijovem (nunca se fala dos bons momentos de tradução em Portugal, mas há um ou outro que correu muito bem) e Raiva de Vencer (dos quais este não é um exemplo), um filme dos anos 80 com o Gene Hackman que me comove sempre um bocadinho, se não por mais nada, por vê-los todos a jogar de All Star calçadas. Até hoje não sei se devo considerar desporto actividades nas quais se pode (deve até) beber pints e fumar. De certezinha que existe mais do que um filme sobre dardos, mas não conheço nenhum, os Coen fizeram a obra definitiva sobre bowling, e o Scorsese tem aquele mistério na carreira chamdo A Cor do Dinheiro, sobre o qual nunca saberei se poderia vir a ser um bom filme caso o Tom Cruise nunca tivesse nascido. Acho que nem assim. E finalmente - era aqui que eu queria chegar - após adiar durante anos por total falta de interesse (eu não sei jogar snooker e mais depressa fico a ver uma partida de curling na televisão) vi o The Hustler e não tenho pensado noutra coisa, mas agora fica para a semana.