terça-feira, 17 de setembro de 2013

BJ

Blue Jasmine tem sido descrito como um corpo estranho na obra de Woody Allen e o providencial regresso aos bons filmes depois do habitual anúncio morte do talento do artista (que acontece, pelo menos desde Stardust Memories, é o quanto a conversa do ano passado depois do filme de Roma é original).

Independentemente da tolice do regresso, pode reconhecer-se que há alguma novidade em Blue Jasmine. Uma personagem como esta, tão "estragada" e destruída por dentro, não é muito habitual em Allen, mesmo que a neurose, a ansiedade, e a doença tenham sido sempre temas presentes. Assim de repente, lembro-me de Charlotte Rampling em Stardust Memories, embora mais usada para caracterizar a personagem de Woody Allen do que para existir enquanto tal, e de Radha Mitchell em Melinda and Melinda, filme sobre o qual nunca entenderei como lhe caiu tanta má opinião em cima. Em Blue Jasmine, tragédia e comédia estão tão sobrepostas como estavam formalmente separadas em Melinda and Melinda (exercício obviamente colado a Malle quanto mais não seja por ver Wallace Shawn a conversar numa mesa de restaurante em Nova Iorque).

É raro ainda que a personagem central seja tão preponderante, mas a isso já não é estranho que seja de Cate Blanchett de quem estamos a falar. E talvez se venha a dizer que Woddy Allen lhe deve este regresso aos bons filmes, mas é muito provável que o contrário não seja menos verdadeiro. Cate Blanchett deve provocar mais noites em branco a Meryl Streep do que Cristiano Ronaldo a Eusébio. É de certeza a melhor actriz da actualidade e pode aspirar a ser a melhor de todos os tempos, mas os últimos dez anos, desde Life Aquatic, foram no mínimo áridos. Entre muito trabalho sem absolutamente nada a apontar como nos Senhores dos Anéis e sucedâneos, Indiana Jones, Robin Hood ou naquele acidente de David Fincher, há alguns exercícios óbvios e aborrecidos como Elizabeth ou Katharine Hepburn e aquele truque de feira algo gratuito de I'm Not There de Todd Haynes.

De Cate Blanchett nunca se espera menos do que a perfeição, e é o que acontece em Blue Jasmine, mas acontece um pouco mais. Esta pode bem ser a personagem de Woody Allen mais bem escrita de sempre. Talvez soubesse que com Blanchett (ele que sempre confessa ter muito pouca paciência para o trabalho dos actores) não podia fazer menos do que isso. É um daqueles encontros que fazem engolir em seco quem já só espera o pior de Woody Allen, mas também quem alimenta embirrações completamente inexplicáveis com Cate Blanchett (ok, aqui admito que seja só eu).

Sem comentários: